Alice Fim
Quatro dias sem grandes
avanços e Carlos estava a desesperar. Estava sentado no café a maldizer a sua
vida, quando António lhe ligou.
- Bom dia menino! Que tal vai
a molenga? _ Brincou.
- Goza, goza. Tens novidade
para mim? Estou a desesperar. Para onde quer que me vire são becos sem saída…
- Olha, por acaso até tenho.
- Então? Não faças suspense.
Diz lá.
- Tinha razão, meu. A velha
foi envenenada com arsénio.
- Eu sabia!!! Ouve, isso onde
é que se arranja?
- Na farmácia, nalgumas só.
Raras, aliás.
- E pode-se comprar assim? Sem
mais nem menos?
- Não. Tem de haver uma
prescrição médica. Mas duvido que algum colega passe isso. Já não se usa. Há
que o use como herbicida… - António ia-se lembrando das coisas à medida que
falava.
- Herbicida? E precisa-se de
receita para isso?
- É pá…não…, Mas a farmácia
tem de registar a quem vende.
- Bingo! Boa. Adeus.
Carlos desligou o telefone sem
esperar que o amigo se despedisse e engoliu a cerveja à pressa. Levantou-se e resolveu
seguir os seus instintos.
- Alice? – Desta vez não bateu
à porta. Abriu e entrou chamando por ela.
Surpresa, ela veio ter com
ele, com uma faca na mão.
- Calma! – Brincou. – Venho
como amigo.
- Amigo? – O homem endoideceu?
– Pensou ela.
- Não estou a perceber. –
Respondeu ainda fria. Depois, lembrando-se de que ele era polícia. – A faca é
dos legumes. Estava a fazer sopa.
- Posso entra?
- Já cá está dentro. – Fez-lhe
ver de um modo acutilante.
- Raios! – Pensou ele. – Não
acerto uma.
Inspirou fundo, colocou o seu
melhor sorriso e disse-lhe:
- Queria mesmo falar consigo.
Já temos a certeza de que foi crime, e apesar de tudo apontar contra si, não
acredito na sua culpa.
Alice abalou-se. Levou a mão
ao peito e deixou-se cair no banco da cozinha, para onde, entretanto tinham
ido.
- Eu? Mas…Não estou a
perceber. Eu não fiz nada!!!
Os seus olhos que no outro dia
mostraram firmeza e frieza, mostravam agira medo e susto. Um pouco também de
indignação.
- Eu acredito. E desconfio de
outra pessoa. Mas para ter a certeza preciso de ter provas. E aqui todos se
calam quando eu apareço. Daí eu precisar de si. Preciso que me acompanhe nas
investigações e seja o meu elo de ligação à comunidade.
- Porquê eu?
- Não sei…Confio em si,
simplesmente.
Assim que pronunciou estas
palavras, Carlos recriminou-se:
- Confio em si? Estás parvo? O
que é que te deu?
Alice olhou-o diretamente nos
olhos e entre eles estabeleceu-se uma comunicação muda.
- Confias? – Perguntou ela.
- Confio. – Confirmou ele.
- Está bem. – Disse ela
passado. Um pouco. – Aguarde só que troque de roupa.
Saiu e Carlos ficou a pensar.
Mas que mulher esta. Que poder ela tinha sobre si? Nunca fizera nada assim em
toda a sua carreira e esta já contava uns bons anos. Bem, agora já estava.
- Já fizeste M*da, agora
aguenta-te! – Ralhou consigo próprio.
Ela veio do quarto
completamente diferente. Arranjada, um pouco de maquilhagem no rosto e um rabo
de cavalo, com alguns fios soltos, davam-lhe um ar de mulher da cidade. Uma
leoa à caça. E ele sentia-se a sua presa.
- Por onde começamos? –
Perguntou ela alheia às cogitações dele, mas não indiferente à sua pessoa.
Também ela se sentia atraída por ele. Não sabia explicar o porquê, mas desde
que falara com ele, que ele povoava os seus sonhos, era personagem principal
dos seus pesadelos, e invadia-lhe a mente durante o dia. Quando o via ao longe
na rua, ou sentado no café, sentia um calor subir por si acima que se revelava
no rubor da face. Felizmente ele não a via…
A viagem à farmácia, foi
inútil. Ninguém tinha vendido isso, já não se usava e era perigoso.
Resolveram ir até Viseu, e
fazer um périplo pelas farmácias, mas as respostas foram as mesmas.
Foram até à rua onde Olinda
morava, e começaram a fazer perguntas acerca dela na mercearia, no café do
bairro, no quiosque, enfim. Nos sítios que ela deveria frequentar. Alice
mostrou-se preciosa. Apresentando-se como vizinha da terra, e amiga, ia metendo
conversa e obtendo informações que depois transmitia a Carlos quando se lhe
juntava no carros ou no café.
A proximidade dos dois foi crescendo,
e o que tinha de acontecer estava prestes a explodir, mas ambos se refreavam.
Voltaram à aldeia com uma mão
cheia de informações acerca do carater de Olinda, que lhes revelava ser ela a
suspeita indicada, mas faltava-lhes aprova derradeira. A aquisição do veneno.
Resolveram falar novamente com
Lurdes, talvez ela os pudesse ajudar…
- Lurdes! – Chamou Alice. -Onde estás?
- Aqui! – Respondeu Lurdes do
fundo do quintal.
Deram a volta e foram dar com Lurdes
a fazer uma queimada no quintal.
- O que estás a fazer?
- A queimar as coisas que
Olinda aqui deixou. Acho que ela embruxou a minha mãe, com as rezas e chás?
- Chás? – Perguntou Carlos. –
Os chás não eram da Alice?
- Não. Estes eram uns que ela
trouxe duma … “adivinha”. Ela disse à minha mãe que alguém lhe tinha lançado um
“mau olhado” e que este chá a iria curar…
- Ó mulher! – Alice
exasperou-se. – E tu nunca disseste nada?
- Não queime mais! – Gritou
Carlos ao ver que ela ia deitar um pacote de chá na fogueira.
Lurdes assustou-se e atirou o
chá para o lado.
- Mas o que se passa? Não estou
a perceber nada.
- Onde mora essa “adivinha”? –
Perguntou Carlos sem lhe responder.
Lurdes, lá lhe disse o nome da
aldeia onde a mulher vivia, e Carlos, pegando no pacote que ela deitara ao chão
e virando-se para Alice, agarrou-a, beijou-a.
- Amo-te! – Disse-lhe segurando-lhe
no rosto. Depois, abraçou-a com força e ordenou-lhe:
- Ficas aqui. Não percas a
Lurdes de vista e não deixas Olinda aproximar-se. Não falem disto a ninguém.
Apanhámo-la!!! Vou fazer uns telefonemas e vou à casa da mulher. Finalmente
apanhámo-la!!!
- Cuidado! – Gritou do portão.
– Amo-te! – Explodiu Feliz!
Lurdes, sem perceber nada, e
atónita com o que acabara de ouvir e ver, perguntou a Alice.
- Podes explicar-me o que se
passa?
- Não sei…- Respondeu corada e
feliz. – Não sei mesmo… Mas é tão bom!
Alice sorriu. Tinham acabado
os seus pesadelos. Todos…
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