A promessa 7

- Mas ela não tem de o saber, pois não?

Era tão bom sentir-se vivo outra vez….

E com este pensamento de pequena vitória adormeceu, e passou o portal para o mundo do sonho. Lá, ele estava a dar aulas numa sala que era o hall da livraria.

Tinha vários alunos, distribuídos por mesas da primária, muito atentos à explicação que ele estava a dar sobre a guerra das rosas.

Então, de repente uma voz conhecida, fez-se ouvir:

- James? Não estou a perceber uma coisa.

Ele virou-se. Era a Alexandra que tinha a cara da Júlia.

Confuso, com aquela situação, ele não percebeu a pergunta e atrapalhou-se a responder. Todos se riram dele e chamaram-no de velho caquético.

A apupar, mandaram-no para casa, e ele muito aflito, correu porta fora, batendo de porta em porta, não encontrando a saída, sempre com os alunos a perseguirem-no.

De repente, a segurar uma porta aberta, estava a Júlia/Alexandra que o chamava.

Sem pensar, ele correu para ela, e ao tentar sair, alguém lhe pregou uma rasteira e ele caiu para um buraco sem fundo…

Acordou assustado e envolto em suor.

Sem conseguir retomar o sono, e não querendo pensar no assunto, levantou-se e foi até à cozinha beber um copo de água.

Olhou pela janela, e viu os primeiros raios de luz da manhã a quererem despontar.

- Ainda bem! – Pensou. – Está mesmo a pedir para ir dar uma corrida, para exorcizar estes sentimentos negativos.

De volta ao quarto, abriu a cama para arejar, e vestiu umas calças de fato de treino largas e uma sweat shirt velha e confortável. Depois procurou pelos ténis de corrida. Já não corria há uns bons meses, pelo que teve dificuldade em encontrá-los.

Ao fim de algum tempo e depois de muito procurar, foi dar com eles enfiados no fundo da dispensa, embrulhados num saco de tecido.

- Coisas da Helen! – Pensou, sentido uma agulhada no coração.

- Porque é que te foste embora? – Perguntou para o vazio.

Cheirou-os. Cheiravam um pouco a mofo, mas nada como uma boa corrida ao ar livre para os arejar e por como “novos”.

Saiu para o quintal e arrepiou-se.

O frio da madrugada entrava-lhe nos ossos e fazia-o tremer. Esticou os braços e o peito e sorriu. Já não se lembrava de sentir aquele arrepio há um bom tempo, e era tão bom voltar a senti-lo. Significava que estava  vivo, vibrante!

Bem disposto iniciou a sua corrida. Primeiro devagar, e depois, à medida que ganhava terreno e confiança acelerou e pouco tempo depois estava no seu ritmo normal. Um ritmo acelerado que não lhe permitia pensar em nada, só correr, só sentir…

Tinha já corrido alguns quilómetros quando a viu a correr uns metros à sua frente.

Com calças de fato de treino pretas e justas, ténis de um rosa vivo, uma t-shirt rosa desmaiada e uns fones colocados nos ouvidos, ela corria a um ritmo cadenciado o qual era acompanhado pelo balouçar do cabelo que trazia apanhado num rabo de cavalo.

Atraído pelo movimento dos quadris e dos glúteos, abrandou o ritmo de modo a que a pudesse observar, sem ser notado.

- Como é jovem e firme! – Pensou.

E sem que ele tivesse algum tipo de controlo, depressa a sua masculinidade o lembrou de que também ele era firme, embora já não muito jovem…

Envergonhado, parou e tentou recuperar a calma e o controlo sobre o seu corpo. Resolveu fazer alguns exercícios de alongamentos para distrair a mente que teimava em fugir para ela, levando consigo todo o seu auto controlo.

Estava de costas, com a perna levantada e encostada a uma árvore, para alongar os gémeos, quando ouviu uma voz que o fez desequilibrar-se e quase cair.

- James? Por aqui?

Virou-se desajeitado.

- Óh! Olá. É verdade.

- Costumas correr? Nunca te vi…

- Pois… - Coçou a cabeça, em sinal de atrapalhação. – Já há muito tempo que não corria. Mas hoje resolvi retomar as minhas corridas.

- Que bom! – Ela sorriu e o sol brilhou mais forte. – É mesmo bom correr. Eu adoro.

Começaram a caminhar em sentido contrário.

- Corres todos os dias? – Perguntou num tom casual, tentando a todo o custo não lhe demonstrar o que estava a sentir.

- Todos os dias não. Mas pelo menos 3 vezes por semana, isto se estiver bom tempo. Se chover sou preguiçosa. E tu?

- Eu? Eu não sou preguiçoso! – Fez uma cara traquina.

- Não é isso, tolo. Tu corres todos os dias?

- Corria sim. Mas depois a Hellen adoeceu e eu deixei de o fazer. Agora quero ver se recomeço.

- Mesmo com chuva?

- Mesmo com chuva. É das melhores sensações. Tens de experimentar!

- Já tomaste o pequeno almoço? – Ela mudou de assunto de repente.

- Não. E estou cheio de fome.

- Queres comer comigo ali no restaurante do rio?

- Adorava, mas não vim preparado… - Ele virou os bolsos do avesso para lhe mostrar que estavam vazios.

- Não faz mal. Eu sou uma mulher prevenida! – Brincou e mostrou uma nota que tirou do bolso de trás das calças.

- Sim, mas isso é para ti. – Retrucou ele.

- Mas por quem me tomas?! – Fingiu indignação. – Achas que como assim tanto ao pequeno almoço? Isto dá para os dois e sobra!!!

- Não. Obrigado, mas.

- Não há, mas nem meio, mas. Hoje pago eu, amanhã pagas tu. Combinado?

E começou a correr em direção ao restaurante.

- Espera! – Gritou ele atrás dela.

Já sentados na mesa, ambos de caneca de café na mão, ficaram calados cada um a pensar “com os seus botões”.

Ele lutava contra a vontade de a agarrar e beijar, de lhe sentir o sabor da pele, o cheiro do seu corpo, de a sentir vibrar ao seu toque, de sentir as mãos dela a percorrerem-lhe o seu corpo, a sentirem-lhe a força do seu ser.

Ela pensava em como ele tinha um corpo atlético, firme e imaginava como seria despido, como seria o seu peito. Gostaria de se afundar nele, de sentir os seus braços que pareciam cheios de força a agarrarem-na, as suas mãos longas a percorrerem-lhe o seu corpo, detendo-se nos seus seios.

- Como seria o sabor dos seus beijos?

Tomando ambos consciência do caminho que as suas imaginações estavam a levar, e não querendo demonstrar o que sentiam, “lembraram-se” repentinamente que tinham afazeres urgentes.

Olhando para o relógio, Júlia exclamou:

- Meu Deus! Já viste as horas? Tenho de ir, se não chego atrasada à livraria. – Levantou-se.

Ele levantou-se também.

- Sim. Também tenho de ir. Tenho uma reunião marcada.

Caminharam juntos um pouco até a uma bifurcação onde os seus caminhos divergiam.

Pararam, e de repente não sabiam como se despedirem. Pareciam tolos, embuçados pelos sentidos. Foi ela quem deu o primeiro passo.

- Então até amanhã. – Disse sorrindo.

- Até amanhã. – Retribuiu ele. – Combinamos correr? – Perguntou uns segundos depois.

- Queres? – Perguntou-lhe ela, referindo-se não só à corrida.

- Quero. – Respondeu-lhe ele entendendo a pergunta.


 

 

 

 

 

 

 

 

 


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