Alice 7

Carlos, não estava satisfeito. A demora dos resultados, ainda que tenha sido pedida urgência, estava a bulir-lhe com os nervos. Como era possível o médico ter ignorado aqueles sinais?  Não. Não iria deixar passar isto em branco, cada dia contava para que as coisas se desvanecessem. Decidiu-se. Resolveu ir ao local e investigar o assunto, mesmo sem autorização superior.

Na esquadra, meteu aqueles dias de férias que há muito o seu superior lhe dizia para tirar e partiu rumo à aldeia.

Chegou cedo, num dia de semana. A aldeia pouca gente tinha nas ruas.

A maior parte das pessoas estava nos campos, na lavoura, e aqueles que não estavam, encontravam-se em casa nos seus afazeres do dia-a-dia. 

Estacionou o carro numa rua lateral à avenida da Tílias, que ia desembocar no largo do coreto, e dirigiu-se ao café. Era um bom lugar para perguntar por um quarto para alugar, enquanto decorria a investigação. De certeza que alguém haveria de saber de alguma coisa.

Entrou, e os três homens que se encontravam ao balcão olharam para ele. Calados. Cada um com um copo de cerveja na mão. Olharam-no de alto a baixo e tiraram-lhe as medidas.

- Bons dias! - Cumprimentou Carlos enquanto se dirigia ao balcão.

-  Queria um café e um croissant se faz favor. - Pediu dirigindo-se ao Ti Norberto.

Pediu também o jornal e sentou-se a ler.

As conversas que tinham parado, logo recomeçaram no tom habitual. Carlos estava "visto", não havia mais nada a dizer.

Os homens foram saindo, e Carlos vendo-se sozinho com o dono do café, aproveitou para se apresentar e perguntar se sabia de algum quarto para arrendar por alguns dias. Perguntou ainda onde era a casa de Lurdes.

Ti Norberto que até aí falara muito abertamente, brincando até, quando ouviu esta última pergunta retraiu-se.

A casa de Lurdes? Porquê? O que queria a polícia com ela?

- Ora Ti Norberto, isso são coisas normais quando alguém morre em casa... - Disse Olinda que nesse momento entrava no café.

- Olá! Voltaste?

Olinda encolheu os ombros e ignorou-o. Pediu um café para si e sentou-se ao balcão.

- Normais? – Retomou o Ti Norberto. -  Já aqui tem muita gente morrido em casa e nunca cá vi a polícia. -  Resmungou enquanto lhe tirava a bica.

Olinda levantou-se e de bica na mão sentou-se ao lado de Carlos.

- Vim ao funeral da Ti Augusta, está-se mesmo a ver.  – Falou para ele. - Pobre mulher, ainda a semana passada estava tão vivinha - Comentou insinuando-se.

Depois, fazendo um ar coquete, estendeu a mão à laia de cumprimento.

- Bom dia. Sou a Olinda. Amiga de Lurdes. Muito amiga mesmo. Posso ajudá-lo?

Ti Norberto espantou-se ao ouvir aqueles disparates. Era preciso ter lata. Todos sabiam que Lurdes lhe tinha um pó!  Raio da mulher, parecia que tinha o diabo no corpo. Mas nada disse. Já tinha muitos anos de balcão e de vida para saber que muitas vezes o melhor era ficar calado, e guardar para si as suas opiniões. Não gostava de confusões.

Carlos, por sua vez olhou-a.

Uma bela mulher, sem dúvida. Não estava à espera de ver alguém assim numa aldeia daquelas. A sua ideia de aldeias e habitantes era muito estereotipada. Agradou-lhe.

- Bom dia, chamo-me Carlos, e sim pode ajudar-me. Pode dizer-me onde fica a casa da sra. Lurdes?

- Melhor do que isso. - Sorriu Olinda. - Posso levá-lo lá!

Ele retribuiu o sorriso, levantou-se e pagou a despesa de ambos ao balcão. Depois virou-se e fez-lhe uma vénia como que a indicar e passagem e seguiu-a porta fora.

Pelo caminho, mais longo que o habitual, Olinda ia espalhando o seu veneno.

Ia-lhe contando como Lurdes se queixava da mãe, do facto de não ter vida própria por ter de tomar conta dela, não que Lurdes fosse má pessoa. Não era! Aqueles costumes é que eram bárbaros, e ela compreendia muito bem a frustração de Lurdes, coitada.

Era uma mulher nova e ver-se assim…

Aliás não era a única. Havia também Alice, uma rapariga que estava nas mesmas condições. Andavam muito juntas a carpir as mágoas. Agora pelo menos uma delas já estava livre...

Alice também não era má rapariga, não o julgasse assim o inspetor, mas ela achava que Alice não exercia boa influência em Lurdes. Falava-lhe de outros sonhos, outras vidas e isso, quanto a ela, só aumentava a angústia de Lurdes por estar ali presa.

Alice prometia-lhe que um dia as duas iriam sair dali e serem muito felizes. Como se isso fosse possível....

Bem agora estavam mais perto...

Olinda ia deixando cair estas insinuações que não passavam despercebidas a Carlos, que tomou nota como nota mental a de que teria de conversar também com essa Alice e ver onde estava a verdade no meio de tanta mentira...

 

 

 

 


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