Alice 8

Chegaram a casa de Lurdes.

Olinda chamou por ela ao mesmo tempo que empurrava a porta e entrava. Ali na aldeia ninguém trancava as portas. As montanhas e o isolamento da mesma eram trancas mais do que suficientes.

Lurdes encontrava-se na sala, apática. Olhava para o vazio, longe do lugar onde se encontrava.

Olinda, não se fez rogada, e fez então as honras da casa. Apresentou Carlos, como sendo um inspetor da polícia judiciaria que vinha averiguar a morte da mãe. Esta afirmação teve o poder de tirar Lurdes do torpor.

- Como? - Não estava a perceber.

- Oh! Não te preocupes, isto é normal. Não é nada de especial! - Olinda falava por Carlos que observava a cena atentamente.

- Mas, polícia? Nunca cá vi nenhum polícia quando morre alguém…- Lurdes insistia.

Tentava perceber o que se passava, ainda dividida entre os dois mundos, presa pela dor, puxada pela vida que tinha de continuar. Porque é que o homem não falava? Porque é que Olinda ali estava? Ai! que dor de cabeça. Não conseguia pensar….

Foi então que Carlos pediu a Olinda que os deixasse a sós.

- Claro que sim. - Respondeu Olinda muito solícita.  - Apenas vou fazer um daqueles chazinhos da Alice que são tão famosos para aconchegarem o corpo e acalmarem a alma...Volto já! -  Saiu.

Carlos aproximou-se de Lurdes que continuava sentada, a olhar para ele, e colocando-se de cócoras à sua frente, cumprimentou-a suavemente.

- Bom dia! – Disse-lhe. - Lamento incomodá-la nesta hora tão má, mas a verdade é que o médico legista encontrou algo de estranho na sua mãe quando a viu...

Lurdes abriu os olhos numa interrogação muda.  Estranho como? Perguntava com o olhar.

Ele explicou-lhe então que o médico, o delegado de saúde, quando veio ver a mãe, tinha encontrado umas manchas estranhas na pele, e que quando a autopsiou tinha encontrado mais anomalias. Nada de conclusivo, mas ele desconfiava de um tipo de envenenamento e queria ter a certeza. Por isso tinha mandado algumas amostras para análise, mas enquanto os resultados não chegavam pedira-lhe, a ele, Carlos, para vir até ali, para ver se conseguia perceber o que se passara de estranho em todo este processo.

- Não percebo nada! - Disse Lurdes. - Envenenada? Mas como?

Nesse momento Olinda entrou na sala e o silêncio instalou-se. Taticamente, e sem o terem combinado resolveram não falar à frente dela. Nenhum dos dois confiava na mulher.

Ela serviu os chás e sentindo o ambiente pesado, desculpou-se com afazeres e saiu, não sem antes recomendar mais uma vez a "especialidade" da Alice, os seus chás miraculosos.

Porém, nenhum dos dois tocou no chá. Por motivos diferentes, ambos o deixaram ficar na chávena, parado a impregnar o ar com aquele odor adocicado...

Foi Carlos quem recomeçou.

Perguntou-lhe como é que se tinha passado o óbito, se ela apresentava alguns sinais indicativos de doença nos dias anteriores, se sabia de alguém que lhe quisesse mal.

A tudo Lurdes respondia que não, que sim, respondia de um modo baralhado.

A morte tinha sido inesperada. Não sabia de ninguém que lhe quisesse mal. Há umas semanas tinha chamado o médico, mas este dissera-lhe que tudo estava bem, que era da idade...

- Que era da idade o quê? – Quis saber Carlos

- Aquelas dores...

- Que dores? -  Carlos insistia tentando perceber.

- Dores...dores no corpo, má disposição. Disse-me que ela não precisava de comer muito porque já não se mexia muito. Que lhe fosse dando uns chás para aliviar a digestão...

Lurdes começou a chorar. Já não bastava a culpa que sentia e agora ainda isto?!

Carlos resolveu não insistir mais. Perguntou-lhe onde poderia encontrar Alice e saiu dizendo-lhe que voltaria a falar com ela quando estivesse mais calma.

 


 


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