Alice 2


           O tempo foi passando e aquela ideia disparatada de Lurdes não saía da cabeças de ambas. No entanto, nenhuma tinha coragem para voltar a falar no assunto.

Os encontros entre as duas também se foram espaçando.

Alice andava triste.

Desde que Olinda chegara com os seus modos chiques que Lurdes não a largava, e já não tinha tempo para ela. Eram desculpas atrás de desculpas. Tinha sempre algo de muito importante a fazer com Olinda, algo que não podia esperar, mas que não se apoquentasse, que ela seria sempre a sua melhor amiga. Estava só a ajudar Olinda que tinha regressado por um motivo triste e precisava de um ombro amigo. Para a semana iriam juntas ao baile da Carriça, a aldeia do outro lado do rio.

Era “O” “baile da Rosa”.

Neste baile uma rosa circulava pelas mulheres e quem a segurava tinha de convidar um homem para dançar com ela. O homem, ou aceitava e tinha de dar uma quantia em dinheiro, para a comissão de festas, ou recusava e era uma vergonha para a mulher. Muitos aproveitavam esta oportunidade para fazer um ajuste de contas.

Alice não queria sequer pensar em ir sozinha.

A noite chegou e Alice foi com a Lurdes ao baile.

Com a Lurdes… e com a Olinda que se tornara num apêndice de Lurdes, ou vice-versa.

A música começou. A rosa começou a circular, uns foram aceitando, outros foram fugindo e outros mais destemidos foram recusando. Chegou a vez de Olinda. Um suspense pairou no ar.

Quem iria ela escolher? Será que ele aceitaria? Alice não duvidava. Ela parecia saída das revistas, com os olhos e os lábios pintados e aquele vestido a condizer com os saltos altos…

Olinda dirigiu-se ao Francisco “malhadas, o gabarola lá da terra.

Olhou-o demoradamente, avançou lenta e segura para ele, e… entregou-lhe a rosa.

Alice não respirava. Também ela queria dançar com ele, mas agora já não podia. Já tinha sido escolhido. Cada vez gostava menos dela. Primeiro Lurdes, agora o Francisco. Mas que raio!!!

Foi então que um burburinho começou.

Primeiro baixinho, incrédulo, a medo, depois explodiu numa gargalhada geral e sonora.

Francisco tinha- a recusado. Ela já não era da terra. Que fosse para de onde veio e deixasse de pôr ideias estúpidas nas cabeças das raparigas de lá.

Olinda ficou parada. Demorou algum tempo a processar o que tinha acontecido. Quando caiu em si, gritou, enxovalhou, amaldiçoou a terra e as gentes, esqueceu os modos finos e saiu a correr, com lágrimas nos olhos, o rímel a escorrer-lhe pela cara.

Lurdes foi a correr atrás dela. Que não ficasse assim. Que eles não mereciam. Ela compreendia-a e se não fosse pela mãe, partiria hoje mesmo com ela para a cidade.

Olinda estancou. A mãe?

- Ó mulher, até nem parece que és de cá. Não sabes que tenho que ficar com a minha mãe até ela morrer? – Lamuriou-se Lurdes exasperada.

- Mas e a Gracinda? Não é ela a mais nova? - Olinda retorquiu confusa.

- A Gracinda fugiu há uns anos com o Manuel da Quinta grande. Fiquei eu. Não posso dar outro desgosto à minha mãe. Ela ainda morria.

Olinda olhou para ela. Apenas com os olhos, porque o seu ser estava longe. “Se a mãe dela morresse, Lurdes ficaria livre para partir, e assim poderia mostrar a todos de que massa era feita. Com ela ninguém gozava! “- Olinda alucinava.

Lurdes assustou-se.

Embora Olinda não tivesse pensado em voz alta, parecia que Lurdes adivinhara o que lhe ia na cabeça, pelo que, assustada, se apressou a dizer rapidamente.

- Mas a minha mãe está muito bem de saúde, e que Deus a conserve assim por muitos anos!!!

Olinda não respondeu.



 

 

 

 


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