Alice 6
Retornado a Viseu, António, o
Delegado de saúde, telefonou a Carlos, um seu amigo inspetor da Judiciária e
convidou-o para jantar. Há muito que não se viam, e esta era uma boa ocasião
para isso. Ver-se-iam e ao mesmo tempo falar-lhe-ia deste caso. Ainda não tinha
feito a autópsia, é certo, mas desconfiava que iria encontrar alguma coisa, e
até já desconfiava do quê.
O pior é que para mandar fazer estas análises precisava de um mandato
judicial, e era aqui que entrava o amigo.
Carlos concordou logo.
Também já tinha sentido a sua falta e andava para lhe ligar, mas….
Combinaram para o dia seguinte às
20.00 h naquele restaurante dos velhos tempos.
António foi o primeiro a chegar, entrou e sentou-se numa mesa em frente à
lareira. Esta estava apagada, era verão, mas era aquela mesa onde se costumavam
sentar antigamente e por isso ele escolheu-a. Pediu um aperitivo, e enquanto
esperava, relia as notas que tirara do "Abstrata" para mostrar a
Carlos sobre o envenenamento por Arsénio. Tudo lhe fazia crer nisso.
Alguns dos sinais provocados por uma exposição a este metal eram:
. Pequeno “milho” ou “Verrugas” nas palmas, solas, e inferior das costas;
. Dor de estômago;
. Náusea;
. Vermelhidão e hiperpigmentada nas pálpebras, nas axilas, nas têmporas, no
pescoço, escroto e mamilos;
. Excesso de crescimento excessivo da camada superficial da pele (Hiper
queratose);
. Densificação da pele e seu desprendimento - descamação;
. As linhas transversais brancas aparecem na cama das unhas.
E António observara alguns deles, vários até, não percebia como o seu
colega não tinha ligado ao assunto…
Entretanto Carlos chegou. Era um homem com cerca 35 anos, alto bem
constituído, moreno com olhos vivos, atentos. Tinha uma barba mal semeada o que
juntamente com o estilo de roupa desportiva que usava, dava-lhe um ar bem mais
novo.
António olhou para ele. Não mudara nada desde a última vez que se falaram,
e já lá iam uns anitos. Foi o que lhe disse ao apertar-lhe a mão.
- Ora, tangas- Respondeu-lhe Carlos rindo-se. - Tu também estás na mesma, tirando a barriga,
as olheiras, a falta de cabelo...- Gozou. António riu-se bem-disposto.
- Está confirmado. Não mudaste MESMO nada.
Entretanto, o empregado aproximou-se da mesa deles.
- Boa tarde senhores. Vão querer alguma coisa? - Perguntou dirigindo-se a
Carlos.
Carlos olhou para António, para o que ele bebia, e pediu o mesmo.
- Então o que é feito? Como estão a Luísa e os miúdos? – Quis saber.
- Bem, lá vão andando, e tu? Já te deixaste apanhar? – “Picou-o” ....
- Nop…
Carlos desculpou-se com a profissão, que não tinha tempo, que não havia
mulheres que aguentassem aquele tipo de vida, etc. Mas a verdade é que Carlos
já tinha visto muita coisa e cada vez acreditava menos no amor.
Tinha pena por um lado, mas, por outro, era bem mais seguro estar sozinho.
Ia onde queria, fazia o que queria, e estava com quem queria. Que melhor vida
poderia haver? - Tentava convencer-se.
- Então, o que tinhas de tão misterioso para me dizer que não pudesses
contar logo ao telefone?
António então contou-lhe as suas suspeitas, o que observara e o que queria
dele. Como já sabia que não iria ser fácil convencê-lo levara-lhe aquela
documentação. Pediu-lhe que não dissesse já que não. Que levasse os documentos para
casa e analisasse.
- Entretanto, se me deres o documento que preciso, eu posso ir pedindo a
análise de vestígios arsénio. – Insistia.
Carlos escutava atentamente e não dizia nada. Conhecia bem António e sabia
da sua adoração por policiais, estivera mesmo para entrar com ele para a polícia
criminal, mas Luiza detivera-o.
Ela não gostava disso, e todos sabem que nestas coisas as mulheres é que
mandam... Nalguns homens, claro. – Regozijou-se. – Ele claramente não era um
deles…
Sabia que o amigo não era leviano e se lhe estava a pedir ajuda, era porque
estava mesmo convencido da verdade do assunto. Então porque não ajudá-lo? Iria
falar com o seu amigo Juiz, ele nunca lhe negava nada, pois já o tinha safado
de muitas situações…
Assim foi.
Passados 4 dias, António deu entrada no laboratório nuclear com uma amostra
de cabelos da vítima, e o documento que Carlos lhe dera. Pedia urgência nos
resultados, tinha o documento que atestava a mesma.
(continua)
Comentários
Enviar um comentário