Francisca 9
7 de
Setembro
Não
sei o que teria acontecido se eles não chegassem naquele momento. A sério! E
não digas que são coisas da minha cabeça, que estou fragilizada, etc. Eu sei
que estou, e que às vezes deixo-me levar pela imaginação e tendo a ver o que
quero e não o que é, mas também sou mulher. E sinto. E sei ver algumas coisas.
Aquele
abraço não foi um abraço de amigo!!!
Não
digo que ele tenha tido alguma intenção. Acredito piamente que ele não sente
nada por mim. Mas, ali. Naquele momento. Eu senti-o!!!
Agora
não sei o que fazer. Quero muito falar com ele, mas tenho medo de que ele não queira
falar comigo…
15 de
Setembro
Foi
hoje o dia D!
D de
divisão.
D de
desespero.
D de dor.
O Rui
saiu de casa. Eu sei que há muito não éramos marido e mulher, mas mesmo assim
doi tanto vê-lo partir…
Abro o
armário e só vejo a minha roupa. Sinto-me órfã!
Não
quero chorar por causa dos miúdos, mas esta bola enche-me a garganta e não
consigo respirar.
O meu
mais pequenito, quando o pai fechou a porta e saiu, veio ter comigo e dando-me
um abraço disse-me:
- Não
te preocupes mamã. Eu e os manos tomamos conta de ti!
Tão
querido. Tão queridos. Todos os três!!!
Não
saíram da minha beira, e até me fizeram o almoço.
Como
se eu fosse capaz de comer…
Agora
estou deitada na cama. Sozinha. Como me parece grande. Imensa.
Quero
chorar e não consigo. Não aqui.
Felizmente,
o meu mais velho voltou para casa. Ao menos isso.
Estou
tão cansada…
Amanhã
vou até à praia. Preciso de ver o mar e contar-lhe os meus segredos.
20 de
Setembro
Só
hoje consegui vir até aqui.
A
praia está quase vazia. Que bom!
Deve
ser por causa do vento. Está um pouco frio e desagradável, mas está como me
sinto, revolta.
Estou
aqui há tanto tempo que perdi a noção das horas. Hoje os miúdos ficaram na
minha mãe, vão lá dormir, pelo que deixei o relógio em casa, e o telemóvel, e
tirei o dia só para mim.
Ao
fundo está um homem com um cão. Não lhe consigo ver o rosto, mas o cão
pareceu-me familiar quando se aproximou um pouco daqui para vir buscar uma bola
que o dono lhe atirou.
Como
parecem felizes!
A vida
parece ser tão fácil para alguns…
Está
outro homem a aproximar-se. Pelo andar perece-me…Será que é? Não isso seria
coincidência a mais. Coisas dessas só acontecem nos filmes.
É
ele!! Depois conto-te tudo. Estou a tremer…
21 de
Setembro
Nem
vais acreditar!
Aconteceu!
Estou…Nem sei como.
Sinto-me
feliz e triste, alegre e preocupada, corajosa e com medo. Tudo ao mesmo tempo.
Era
ele sim. Vinha a andar junto à rebentação, descalço, calças arregaçadas e
sapatos na mão.
O
cachecol parecia querer sair-lhe do pescoço, longo e forte. Na cabeça trazia um
gorro que lhe ficava a “matar” ou não fosse ele um jovem.
Não
resisti. Levantei-me e fui ter com ele.
- Bom
dia! Assim disfarçado ninguém te conhece. – Sorri para disfarçar o nervosismo.
- Bom
dia! – Sorriu-me sem dizer nenhuma graça.
Comecei
a pensar que tinha feito mal em ter ido ter com ele. Aconcheguei o cachecol ao
pescoço e estremeci com o vento.
- Isso
é que é coragem! – Comentei apontando para os pés na água. – Só de olhar fico
gelada.
- É
uma questão de hábito. – Saiu da água, e começou a andar para o areal.
- Como
estás? – Perguntou-me olhando para trás.
Eu
tinha ficado parada à beira mar.
Avancei
uns passos na direção dele, sem saber muito bem se ele queria que o
acompanhasse, ou se queria ficar sozinho.
- Mais
ou menos. – Avancei um pouco. – O Rui saiu de casa.
- Eu
sei.
-
Sabes? – Estava verdadeiramente surpresa e avancei mais na direção dele.
Ele
sentou-se e eu sentei-me ao seu lado.
- A
dona Manuela… - Respondeu-me com aquele ar de que era escusada a minha
pergunta.
- Ah!
Pois! – Retorno eu, e fiz uma cara cómica, tentando retomar aquele clima entre
nós que parecia ter desaparecido.
Ele
riu-se.
- Foi
por minha causa? – Perguntou passado um bocado em que ambos ficámos calados.
- Por
tua causa? – Não percebi a pergunta.
- Sim.
Quando eles chegaram, nós estávamos abraçados. Não sei se ele viu. Desde aí que
tenho estado preocupado. Tenho querido falar contigo, mas não sabia se o
haveria de fazer. Se iria pior as coisas…
O ar
dele era miserável. O meu peito encheu-se de pena.
- Não.
Não tiveste nada a ver com o assunto. Acho que ele nem viu. Ou se viu, fez de
conta que não viu. Não! Ele já tinha anunciado que se ia embora. Só não tinha
dito o dia…
Ele
olhou-me e não disse nada.
- Mas
eu estou bem. – Menti.
Ele
levou as mãos à cabeça e praguejou.
-
Céus! – Deixou escapar.
Fiz-lhe
uma festa na cabeça. Parecia tão aflito. Mais perdido do que eu.
- O
que tens? Porque estás assim?
Segurou-me
a mão por uns momentos, e depois com raiva afastou-a.
Assustei-me,
mas mantive-me calada. Com o Rui aprendi que era melhor assim. Ficar calada à
espera que a tempestade acalmasse.
- Não
percebes? – Disse por fim. – Eu sou uma fraude.
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