Francisca 8


           Percebes como estou? A ficar louca, só pode!!! Tenho de ter muito cuidado para não perder a amizade dele. Tenho de me controlar…
Aiii. Já não tinha problemas que chegassem? Ainda bem que ele está fora. Assim posso pensar melhor.
E ainda bem que tu existes!! Depois de escrever sinto-me outra. Os problemas parecem mais pequeninos e as ideias mais arrumadas…
2 de Agosto
O Pedro ontem veio ter comigo à cozinha, com uma conversa muito estranha.
Começou por dizer-me que eu era muito bonita e que me devia arranjar mais. Depois, andou em círculos, em círculos até que finalmente me perguntou porque é que eu não me separava do pai.
Fiquei tão atrapalhada que deixei cair o que tinha na mão e praguejei ao apanhar a taça e ao ver o seu conteúdo espalhado pelo chão. Pedi logo desculpa pelo palavrão. Não gosto nada de os dizer.
- Pára! – Ralhou-me ele. – Não estejas sempre a pedir desculpas. – Disse-me zangado.
Olhei para ele confusa. O que é que se estava a passar?!
- Que conversa é essa? – Perguntei-lhe.
- Porque é que não te separas dele? Porque é que não te arranjas? Porque é que não te impões? Estás sempre a dizer-nos que temos de respeitar os mais velhos e sobretudo os pais, mas tu não te dás ao respeito! – Gritou.
- Desculpa?! Não me dou ao respeito? O que queres dizer com isso? – Gritei de volta.
Passei-me. Não me dou ao respeito? O que é que ele queria dizer com aquilo? Eu sou uma mulher respeitável. Nunca fiz nada que me envergonhasse a mim nem a ninguém!!!
- Quero dizer que deixas que ele te desrespeite. Que te fale daqueles modos. Tens de te impor!
Respirei fundo. Afinal o que ele queria dizer era aquilo. Olhei para ele com o coração partido. O meu pequenino estava ali, zangado comigo e zangado com o pai.
O que fiz eu? Que vida escolhi para lhes dar? Que pai escolhi para eles?
Aproximei-me dele e tentei abraçá-lo e beijá-lo na cabeça, mas ele afastou-me bruscamente.
- Pára! Fazes sempre isso. Os abraços não resolvem tudo. Não são uma borracha para apagar os erros.
Virou as costas.
- Vou jantar à avó, e se calhar durmo por lá.
E saiu deixando-me à beira das lágrimas, de taça na mão e o chão por limpar…
Entretanto entrou o meu mais pequenito. Ouviu os gritos e ao ver o irmão sair, veio ver o que se passava.
- Não se passa nada. – Disse-lhe, baixando-me para limpar o chão e para que ele não visse as minhas lágrimas.
Ele aproximou-se e abraçou-me por trás.
- Gosto muito de ti mamã…
8 de Agosto
As palavras do Pedro não me saem da cabeça. Se calhar era o que eu deveria fazer. Mas e depois? Como é que eu vou viver? Eu não tenho trabalho…E as pessoas? E os meus pais? Não lhes posso dar esse desgosto.
1 de Setembro
O Rui hoje veio com uma conversa estranha. Não gostei e não percebi muito bem. Parece-me que quer sair de casa e está a usar o filho como desculpa.
Que saia. Resolvia-me um problema.
5 de Setembro
Esta manhã encontrei o Gabriel na praça. Nunca mais tinha falado com ele, desde aquele encontro. Só algumas palavras de ocasião, trocadas ao fim da missa.
Foi tão estranho…
Estávamos ambos constrangidos, mas disfarçamos bem.
Ele perguntou-me como estavam as coisas, e eu sem me conseguir conter, convidei-o para jantar cá em casa. E ele aceitou!!!
- Nunca recuso um bom petisco! – Respondeu. Imagina só!!!
Eu e a minha grande boca! Felizmente tenho-os cá em casa.
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Não me acredito!
O Rui combinou ir jantar aos meus sogros com os miúdos e não me disse nada! Realmente eu já não represento nada para ele. Não é que eu queira ir jantar com aqueles dois, mas caramba!!!
Acho que mereço algum respeito, alguma consideração! Fiz birra e não o deixei levar o mais pequenito.
E agora? Telefono a cancelar o jantar? É melhor…
6 de Setembro
Com a confusão que se criou quando lhe disse que o pequenito ficava comigo, esqueci-me de telefonar ao Gabriel para desmarcar o jantar, e quando me lembrei disso já era tarde.
Felizmente tinha a comida preparada, pelo que foi só colocar o tabuleiro no forno e esperar.
Ele chegou à hora marcada. Trazia um ramo de flores e uma garrafa de vinho.
- Olá. As flores para uma flor e o vinho para o teu marido. – Cumprimentou-me a brincar com um piropo foleiro.
Ri-me.
- Podias ser mais original. – Disse-lhe. – Podias dar-me o vinho a mim e as flores a ele.
Abriu os braços, encolheu os ombros e disse:
- Pode ser…Tu casa, tu reino… - Continuou a brincar.
- Entra. – Digo-lhe eu. – Vai para a sala, que eu já lá vou ter.
Fui para a cozinha, coloquei as flores numa jarra, e voltei à sala.
Estavam os dois numa alegre conversa e não deram por mim. Deixei-me estar um pouco a observá-los.
- Mãe! O jantar? Estou cheio de fome.
Sorri.
- Já vai, já vai. Vou só poisar aqui as flores.
O jantar decorreu alegremente e depois de estarmos um pouquinho a falar, mandei o pequenito para cima, para se ir deitar.
Fui lá acima dar-lhe um beijinho e quando regressei, ele tinha levantado a mesa e levado as coisas para a cozinha.
- Obrigada. – Agradeci-lhe. – Não era preciso…
- Porquê? Não precisas de ajuda?
- Ora, sabes a que me refiro… - Sentei-me no sofá. – Queres beber mais alguma coisa?
- Não. Tenho de ir andando…
- Já?
- O teu marido? Deve estar a chegar…
- Deve…
- Como estão as coisas?
- Não estão.
- Como assim? – Ele sentou-se no sofá ao meu lado.
- Parece-me que o Rui quer o divórcio…
- A sério?
Acenei com a cabeça.
- E tu? Como te sentes?
Encolhi os ombros.
- Vais ver que ele muda de ideias. Têm de conversar com calma. Ele é um bom homem. De certeza que não quer sair de casa. É só uma fase que deve estar a passar…
Ele segurou-me na mão e olhou-me daquele modo. Não fui capaz de lhe suster o olhar e baixei a cabeça. Ele encostou-a ao seu ombro, e ao sentir-me tremer sussurrou:
- Calma, calma. Tudo vai ficar bem…
Queria ficar ali para sempre…















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