António 7 - Fim
Espreitou
por entre o trinco.
- O
que queres? – Perguntou entre dentes. - Ainda acordas a vizinhança.
- Por
favor abre, quero falar contigo.
- Eu
hoje já ouvi o suficiente. - Fechou a porta. – Vai-te embora. – Respondeu do
outro lado dela.
Manuela
percebeu que não podia insistir mais e sentou-se nos degraus a pensar.
Se
calhar era melhor assim.
Também
não sabia bem o que lhe dizer. Tinha a sensação de que o que quer que lhe
dissesse ele não iria acreditar, e dizer-lhe o quê, mesmo?
Aquela
filha da mãe… Nunca esperara isso dela, já se tinha esquecido do que passara,
do quanto fora pisada e agora fazer isto a um doce como o António? Se havia
alguém que não merecia era ele.
Do
outro lado da porta António estava sentado no chão com a cabeça apoiada nos
joelhos, e cansado de tanto chorar adormeceu.
Já
Manuela não pregava olho. Sofria por saber que António estava a sofrer e sofria
por querer consolá-lo e não saber o que dizer. Tinha de fazer alguma coisa,
isso ela sabia, só não sabia como, nem o quê.
Nisto
chega Manuel. Saiu do carro e abeirando-se dela gritou-lhe.
- O
que fazes aí?
- Chiu!
- Ainda acordas a vizinhança. – Manuela repetiu as palavras de António. – Vim
atrás dele.
- Isso
já eu vi, mas a que propósito? - A voz saia entaramelada, resultado do jantar.
- Ora,
a que propósito. Como se já não soubesses. Como é que sabias que eu estava
aqui?
- Porque
voltei atrás para te ir buscar e a Dores disse-me que tinhas saído atrás dele.
- Ai
sim? – O tom de escárnio era notório. – E não te contou mais nada?
Manuel
respirou fundo e sentou-se ao seu lado. Incapaz de falar baixo disse-lhe:
- Sim
contou. Mas também o que é que ele estava à espera? Um mulherão daqueles…Não é
para a minhas unhas quanto mais para as dele.
Isto
foi a gota de água para ela. Duas vezes na mesma noite não. E perdendo o controlo,
levantou-se e gritou.
Gritou
que António tinha mais numa unha do pé do que ele no corpo inteiro, que ele era
um homem com um “H” grande, que se não fosse por ele, Manuel estaria debaixo da
ponte porque quem resolvia sempre as m*das que ele fazia era o António, e por
fim, disse-lhe que António merecia uma mulher que fosse digna dele, alguém que
o amasse e respeitasse e o ajudasse a ir longe nesta vida.
Sim,
porque ele tinha muita capacidade para ir longe e se ainda não o fizera era
porque estava rodeado de parasitas bêbados como ele e os outros que o acompanhavam.
- Parasitas
bêbados? – Manuel levantando-se também lhe respondeu aos berros:
- Parasitas?
Quem é que te paga os jantares quando comes fora? Quem é que te compra os
sapatos com que tu embeiças? Parasitas?
- Sério?!
Vais entrar por aí? – Manuela sibilou. – Metes-me nojo. - E virou as costas pronta a ir-se embora.
Manuel
trôpego, tentou pará-la, mas p que conseguiu foi com um grande estrondo
derrubar um caixote de lixo e cair para cima dela.
António
que, entretanto, ouvira tudo, e percebeu finalmente o que se passava, abriu a
porta e dando o murro que há muito tempo devia a Manuel, pegou nela com cuidado
e levando-a para casa fechou a porta.
Fechou
a porta a Manuel, a Maria das Dores, à antiga vida e … a todos os problemas.
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