Carolina 18
Era um daqueles dias em
que o vento parece chamar pela chuva, em que se sente um rebuliço na natureza,
as folhas voam revoltas, os cães ladram ao vento, os gatos miam, as aves fazem
voos picados, e toda esta agitação, esta energia, faz-se sentir nos animais e
nos Homens.
Carolina não era exceção.
Sentia-se nervosa,
impaciente, arrependida de ter tomado aquela decisão.
Estava para não ir, mas
faltar à palavra dada não era coisa sua. E depois lembrou-se da sua avó, ou do
que lhe contavam dela. Era uma mulher de coragem que lhe legara o nome e o
feitio, diziam.
- Então vá! Faz jus ao
nome e deixa-te palermices. – Ouvia a mãe na sua cabeça.
- Está bem...-
Respondeu também na sua cabeça. – Eu vou…
Também Filipe sentia os
efeitos da natureza em si.
Embora tranquilo em relação ao encontro - Depois
da irmã lhe ter falado da velha dos gatos o seu entusiasmo esmorecera. - Sentia-se,
contudo, agitado interiormente. Era o vento forte. Bulia-lhe com os nervos –
Desculpava-se.
Não tinha vontade
nenhuma de ir.
Não fosse ser um homem
de caráter e ter oferecido esperança a alguém, mandava um Mail a dizer que não
ia...
Mas ele era um homem de
caráter e além do mais os textos em bons, por isso resolveu-se a ir.
Uma vez tomada a
decisão final, inspirou e expirou fundo umas quantas vezes, fumou um par de
cigarros e sentiu-se pronto para a “aventura”, mas agora tranquilo e sem
preocupações.
Teria era de ter algum
cuidado e não dar demasiadas expectativas, pois embora os textos fossem
realmente bons e eles os pudessem publicar, quem tinha sempre a última palavra
era o público e às vezes as coisas não corriam como esperado.
E a irmã! Não se podia
esquecer dela. Temperamental como era podia bem virar o bico ao prego…
- Tenho de frisar bem
isso à senhora. - Pensava enquanto estacionava.
Lentamente saiu do carro e esticou-se. As suas
costas nunca mais foram as mesmas desde aquele acidente. E o frio que se fazia
sentir não ajudava nada.
- Bem lá terá de ser-
Convenceu-se.
Aconchegou o cachecol ao pescoço, enfiou as
mãos nos bolsos da Parka, e lá foi ele. Devagar. Sem pressas.
Chegou ao local meia
hora antes da hora combinada. De propósito, pois, gostava de observar o
ambiente, de ver antes de ser visto.
Escolhera o jardim onde
ocorrera o crime, porque depois da entrevista tinha algumas perguntas mais a
fazer à dona do café, cujo nome ainda não sabia.
Tomou outra nota
mental, perguntar-lhe o nome e escrevê-lo no bloquinho que andava sempre com
ele.
Assim que chegou ao
café, escolheu uma mesa o mais longe do quiosque, pois não queria que a sua
conversa fosse escutada e repetida pela dona do estabelecimento.
Sentou-se, sentindo o frio gélido do metal da
cadeira e começou a observar as mesas ao lado.
Estavam mais cheias do
que ele esperava, quase todas ocupadas e algumas com senhoras sozinhas!
Outras com casais,
outras com homens sós, outras com duas ou três pessoas, outras vazias…
E foi então que se
apercebeu que na troca de mails, falaram de tudo menos da maneira de se
reconhecerem.
Nem ele, nem ela, se
tinham lembrado disso. De uma coisa tão básica!!!
Do mesmo se tinha dado
conta Carolina, que embrulhada no seu cachecol, olhava para todas as mesas à
procura de um homem de meia idade de fato e gravata como a sua imaginação lho
apresentava.
Não via nenhum. Estava
a começar a sentir que fizera figura de tola ao ir assim “às cegas” para um encontro.
Arrependia-se agora de não ter aceite a ajuda de Gabriel.
Filipe ficou irritado
consigo próprio. Como é que cometera uma gafe destas? Parecia um principiante!
Olhou para o relógio. Passavam 15 minutos da
hora e não via velha alguma sentada nas mesas do café ou nos bancos do jardim à
volta.
Seria que ela se tinha
esquecido? Começava a dar razão à irmã e a arrepender-se de ter ido. Quem o
mandava ter palavra? Estaria bem melhor em casa num dia destes.
- Boa tarde Carolina! –
Ouviu a Maria (Maria era o nome da Sra. do Café – ele mal chegara
perguntou-lhe) dizer a uma mulher sentada duas mesas à sua frente.
Carolina? As orelhas de
Filipe cresceram e direcionaram-se para a mesa onde decorria a conversa.
- Boa tarde Maria. Já
tinha dado pela sua falta. - A mulher sorriu e fez umas covinhas no rosto que
não lhe passaram despercebidas.
- É! Hoje atrasei-me, o
meu mais velho fez birra e tive de o deixar na vizinha. Então, está muito frio
hoje não está? - Referia-se ao fato de a Carolina estar toda enroscada no
sobretudo e cachecol.
- Está, está! Estava-se
bem era em casa, e é para onde vou não tarda nada...- Sorriu mais uma vez
agarrando a caneca de chocolate quente que tinha à frente. Olhou para o relógio
e disse
- É só acabar
isto...Assim como assim já passa muito da hora.
Esta frase quase fez
Filipe saltar da cadeira. Já passava da hora? Aquela, era a
Carolina? Seria? Não podia ser. Não era velha. E onde estavam os gatos?
O seu cérebro funcionava a velocidade da luz.
E se não fosse ela? A mulher dizia que se chamava Catarina. Só no último Mail é
que assinou Carolina, o que o levou a pensar numa velha já com algum grau de
baralhação ...
Por outro lado, quais eram as hipóteses de não
ser ela? Haveria assim tantas Carolinas? E logo ali?
Era coincidência a mais
e ele não era crente. Vê-la poisar a caneca vazia e mexer na mala deu-lhe o
impulso que necessitava. Sem pensar mais, levantou-se e aproximando-se da mesa
dela interpelou-a:
- Boa tarde, desculpe. É
a Carolina?
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