Carolina 17
Só quando a irmã o
mandou sentar e esperar um bocado pois estava a acabar de escrever um parágrafo
do seu novo livro, é que ele se lembrou de ir ver quem lhe escrevera.
Ao ver de quem era,
começou a sentir o coração acelerado.
Leu-o de “um só trago”
sentindo-se um adolescente perante um primeiro encontro. Reparou que em vez de
Catarina ela assinara Carolina, mas não prestou grande atenção ao detalhe.
Sentia friozinho na
barriga só de pensar que se ia encontrar com ela, tal como quando era puto e foi
sair pela primeira vez com a Ana. Esperava que este “encontro” corresse melhor
do que aquele. Ainda hoje se sentia embaraçado ao pensar no que acontecera…
- Mas o que é que tens?
– Perguntou-lhe a irmã. - Pareces aéreo. Estou aqui a perguntar-te o que achas
do meu conto e tu estás com a cabeça na lua. Mas afinal o que se passa?
- Nada, nada- Respondeu
distraído.
- Nada o “tanas”. Desde
que vieste de lá que não és o mesmo.
Referia-se ao país
Africano onde Filipe fora fazer uma reportagem sobre a guerra. Se vieste cá foi
por alguma coisa, ou foi só porque tinhas saudades minhas? - A ironia de Teresa
nunca desaparecia, mesmo com quem ela mais gostava.
Ele não respondeu,
perdido nos seus pensamentos. Seria que saberia ir bem vestido? Devia fazer a
barba ou deixá-la com dois ou três dias como estava na moda.
- Até parece que foi a
tua primeira guerra. - Ela insistia.
- Ouve, estou bem
assim? – Perguntou-lhe de repente.
- Hein?
- Devia ter feito a
barba não devia?
- Mau! Não estou a
perceber e não estou a gostar. Senta-te aqui, anda, senta-te e diz-me o que se
está a passar, se fazes favor.
Puxou-o para o sofá,
sentando-o ao lado dela.
- Não se está a passar
nada. A sério. – Apressou-se a responder, apercebendo-se da pergunta ridícula
que lhe fizera.
- Vou só encontrar-me
com a Catarina.
- Ah! Percebo...Quem é
a Catarina? E desde quando é que te preocupas com o teu aspeto? Essa é nova...-
Picou-o Teresa.
- Quem é essa bruxa?
Nunca te vi assim.…De certeza que foste enfeitiçado.
- Só se foi à
distância. Nunca a vi. – Ele entrou no jogo.
- Ui, telepatia...Esses
feitiços são dos fortes.
Levantou-se e começou a
andar pela sala imitando uma bruxa com uma varinha mágica a lançar feitiços
pelo ar. Filipe riu-se. Riram-se os dois.
- Agora a sério, quem é
ela?
- Agora a sério, não
sei. – Respondeu ele divertido.
- Como assim?
- Não sei, não a
conheço. É a dos contos de que te falei.
- Quais contos?
Teresa era assim.
Entusiasmada que estava com o novo projeto do livro, deixara para trás tudo o
que não tivesse a ver diretamente com ele. Agência e namorados, tudo ficava
esquecido.
Felizmente tinha
colaboradores que remavam o barco impedindo- o de andar à deriva, quando ela
saltava borda fora.
- Aquele conto! Da saia
da Carolina? Lembras-te? Disseste-me para tomar conta disso e eu avancei com o
assunto. Vou encontrar-me com ela.
- E é preciso estares
assim? Vais ver que ainda te calha uma velha dona de gatos na rifa.
- Achas? – Ele nunca
tinha pensado nisso.
- Com um nome desses.
- Pois...Nunca tinha
pensado nisso. Sempre pensei que fosse da tua, hum, da minha idade, mais ou
menos...
- Porque?
- Porque...sei lá
porquê. Não sei. Aliás tudo isto é muito estranho. Não sei o que me impele a
conhecê-la e a ter esta ansiedade. Nunca me lembro de ter sentido assim com um
blind date. Se calhar estou mesmo enfeitiçado...
- Estás, estás...
- Mas deves ter razão…
- Hã? No quê?
- Nisso de ser velha.
Neste último mail ela enganou-se no nome…
- Como assim? – Agora
Teresa estava interessada.
- Assinou Carolina em
vez de Catarina. Deve-se ter baralhado…
- Pois. O Alzheimer é
tramado…- Brincou ela mais uma vez
Filipe atirou-lhe com
um:
- Vai-te…
Teresa ignorou-o. Levantou-se
foi até ao computador e abriu os mails.
- Ora vamos lá a ler
isto...- Falava para o computador.
Enquanto ela lia,
instalou-se um silêncio incômodo na sala. Ele sentia-se nervoso, ansiava pela
sua aprovação. Outra coisa que não era costume seu.
- Então? – Perguntou
passado algum tempo de ela ter acabado de ler e não se manifestar.
- Então...- Ela
picava-o
- Vá lá. O que achas?
- Acho que estás mesmo
enfeitiçado. Isso ou louco. Os contos são bons, sim. Poderemos trabalhá-los,
mas desde quando é que te interessas por este tipo de estórias? E desde quando
é que marcas reuniões sem mim?
Ela levantou-se e
abraçou-o por trás perguntando-lhe ao ouvido:
- Desde quando é que te
preocupas com o teu aspeto?
Depois já afastada,
junto à janela, “atirou-lhe” rindo-se:
- Vais ver que ainda te
calha uma velha cheia de pelos de gato!!!
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