Matilda 5

- Isso não é meu! – Repetia, cada vez mais assustada.

- Calma. Isto só pode ser um engano. – Interveio Fábio.

- Sim um engano. – Secundou-o Paula. – A minha amiga não é nenhuma ladra!!! – Afirmou energeticamente.

- Isso não me cabe a mim decidir. – Retorquiu o segurança do aeroporto com um ar de felicidade estampado num rosto gordo e borbulhento que uma barba grossa e preta tentava disfarçar. – Isso é assunto para a polícia e para os juízes. – Rematou visivelmente satisfeito consigo próprio.

- Esta cabra há-de aprender a comportar-se. – Regozijou-se internamente.

E, pegando numas algemas que tinha presas ao cinto, dirigiu-se para Matilda que estava sem reação, repetindo “isso não é meu”, “isso não é meu”, como se fosse uma mantra.

- Mas o que pensa que está a fazer? – Fábio entrepôs-se entre eles.

Com um empurrão o segurança afastou-o, e quando ele tentou reagir, deu-lhe com o cassetete nas pernas.

Gritando com uma dor aguda que sentiu com a pancada, caiu ao chão, enquanto o segurança colocava as algemas a Matilda que, assustada, estava sem reação.

Lágrimas grandes e quentes corriam-lhe pelo rosto e banhavam-lhe as palavras:

- Isso não é meu. Eu não roubei…Isso não é meu…

- Para onde a levam? – Paula gritou enquanto junto a Fábio, tentava ajudá-lo a levantar-se. – Não te preocupes. Nós vamos buscar-te! – Tentou alentar a amiga.

Matilda foi arrastada para fora da sala e metida numa carrinha. Os amigos tentavam em vão falar com alguém que lhes dissesse para a onde levavam, mas a única resposta que obtinham era a de que seria entregue às autoridades. Onde? Quais? Ninguém dizia.

Entretanto a hora da partida aproximava-se.

Sem saberem muito bem o que fazer, Fábio decidiu que Paula partiria com o grupo, enquanto ele ligaria para o irmão de Matilda. Ele era advogado. Com certeza que saberia como haveriam de proceder numa situação destas…

- Partir e deixar-vos aqui sozinhos? – Indignou-se. – Mas é que nem penses! Eu vou, mas é avisar o resto do grupo que nós ficaremos cá para resolver isto.

E sem mais demora saiu em direção à zona de embarque deixando Fábio aliviado por não ter de ficar ali sozinho.

- Estou? Miguel?

- Olá Fábio. Está tudo bem? Já estão no aeroporto? O voo, sempre sai a horas? – Miguel estava bem disposto e cheio de saudades.

- Sim, não, quer dizer não sei bem… - Titubeou.

- Então? O que se passa? Algum problema com o avião? – Perguntou longe de imaginar o que tinha acontecido.

- É a Matilda…

- A Matilda? – O coração dele deu uma pancada forte e seca. – O que tem ela? Aconteceu alguma coisa? Está ferida? Para onde a levaram? – Perguntava em catadupa sem dar tempo ao Fábio de responder. – Vou apanhar o próximo voo para aí.

- Sim, não. Quer dizer, sim vem, por favor. – Ela está presa. Roubou uma estatueta. Dizem eles. – Fábio falava entrecortado.

- Vou para aí. Fica aí por favor.

- Mas ela está bem de saúde. – Quis ainda dizer, mas Miguel já tinha terminado a chamada.

Assim que desligou o aparelho, Miguel correu para casa, pegou no seu computador, colocou-o na mochila, pegou no livro de direito que era a sua “bíblia”, mais por hábito do que por utilidade, e, tirando o telemóvel do bolso do casaco atirado com pressa para cima do sofá, fez alguns telefonemas.

É incrível como nos dias de hoje, com dinheiro e alguma influência se consegue tudo. Ou melhor, quase tudo.

Recorrendo a amigos bem posicionados, ele conseguiu um voo para a Tunísia ainda naquela tarde.

Parecia, se não soubéssemos que era verdade, que estaríamos numa pelicula de cinema americano onde tudo acontece e onde tudo é possível do “pé para a mão”.

Com o voo garantido, olhou para o relógio. Faltava apenas uma hora. Teria de correr, ou melhor de “voar”, se quisesse chegar a horas ao aeroporto.

Abençoando as modernices dos dias de hoje, fez o check in on line, e saiu porta fora, disparado.

No avião, quis o destino, que Miguel se sentasse ao lado de um psicólogo clínico, um rapaz novo, dos seus 30 anos, que regressava à Tunísia para visitar a sua família materna.

Filho de um Finlandês e de uma Tunisina, fora criado na europa, e não fosse a cor morena e o cabelo escuro, os olhos azuis e as boas maneiras, fá-lo-iam passar por um europeu de boas famílias.

Mas em nada disto Miguel reparou. Estava muito preocupado e um pouco agitado.

Não via a hora de chegar, mas ao mesmo tempo temia-a, pois não tendo tido tempo de se preparar e não conhecendo as leis daquele país temia o pior. Assim, tentava procurar no google as leis tunisinas, casos de roubo que tivessem sido ilibados, possíveis motivos para anular condenações, o que fosse.

Qualquer coisa que ajudasse a irmã…

Felizmente por um lado, infelizmente por outro aquele voo não era direto o que lhe dava algumas horas para se preparar. Para tentar preparar-se…

Enquanto o fazia, praguejava baixinho sem disso se aperceber. Sob pressão era-lhe difícil de raciocinar e o facto de ser a irmã, não o deixava ser objetivo. Sentia que estava numa luta injusta e contra o tempo.

Os piores cenários passavam-lhe pela cabeça.

Josh, assim se chamava o psicólogo olhava-o divertido. Não conhecia a língua, mas adivinhava-lhe o sentido das palavras, e achava-lhe piada aos gestos e aos trejeitos.

Curioso, espreitou para o que ele estava a pesquisar. Em inglês conseguiu vislumbrar as palavras lei, roubo e Tunísia.

- Hum…Estranho. – Pensou. – Normalmente procuram, tradições, cultura, locais a visitar…

Olhou com mais atenção. O rapaz parecia deveras preocupado. Viu as horas. Ainda faltavam 5 horas para chegarem a Monastir. E, não lhe apetecia ler, nem estava com vontade de dormir…

- Desculpe-me. – Interpelou-o em inglês. – Não pude deixar de o ouvir, e a curiosidade levou a melhor sobre as minhas boas maneiras, levando-me a espreitar a sua pesquisa. Posso ajudá-lo?

- Perdão? – Miguel estava com a cabeça ainda nas leis tunisinas.

- Reparei que pesquisa sobre as leis tunisinas. Eu sou psicólogo criminal, posso esclarecer-lhe algumas dúvidas…Isto se quiser, claro… - Acrescentou vendo o olhar alucinado de Miguel.

Miguel demorou alguns segundos a entrar na realidade e a processar a informação que lhe chegara aos ouvidos. Um psicólogo criminal? Seria possível? Seria Deus a ajudá-los? Ou os pais? Ou estaria a alucinar?

Com um sorriso tímido, acabou por responder, estendendo a mão:

- Prazer. O meu nome é Miguel Pereira. Sou advogado e agradeço muito a sua ajuda.

Mais uma vez, isto parecia uma cena dos filmes de Hollywood, mas não era.

- Josh Rinne. – Retribuiu o cumprimento. – O que procura?

Miguel suspirou. Poderia confiar nele? Deveria confiar? Afinal não o conhecia de lado nenhum. E o que faria ele ali? Foi isso que começou por lhe perguntar, fugindo à sua pergunta.

- Venho visitar a minha família. – Respondeu com simplicidade.

- Ah! – Foi o único comentário que lhe ocorreu fazer.

- E o…Miguel?! O que vem fazer à minha terra? – Brincou.

Miguel, tornou a suspirar. “Perdido por cem, perdido por mil”, pensou. Seja o que “Deus quiser” …

- Bem, como lhe disse sou advogado, e venho tentar tirar a minha irmã da prisão.



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