Simão 4
Os
dias foram passando e Simão estava cada vez mais entusiasmado. Afinal aquele
trabalho era interessante, as pessoas velhas, ao contrário de serem chatas e
doidas, eram divertidas e tinham muitas histórias engraçadas e interessantes
para contar.
Havia,
claro, alguns velhos que correspondiam à imagem que inicialmente Simão tinha
deles, mas esses estavam noutra ala e ele lidava pouco com eles. Também a amizade entre Simão e os enfermeiros
foi crescendo e à medida que lhe davam mais responsabilidades e ele
correspondia ao que era esperado, aumentava também o respeito que todos lhe
tinham.
Simão
andava feliz, e isso notava-se não só no lar, onde passava a maior parte do
dia, como também em casa e fora dela.
A
relação com a mãe tinha melhorado bastante, ele começou-a a ver com outros
olhos, mais compreensivos e as discussões foram sendo cada vez mais raras.
Já
na rua, como ele pouco tempo por lá parava, os amigos começaram a sentir-lhe a
falta e a fazer algum bulling para que ele largasse o lar e voltasse à sua
companhia. Mas Simão não cedia, antes pelo contrário, ao abrirem-se-lhe os
“horizontes”, perguntava-se cada vez mais como tinha sido possível, outrora,
ele ter sido “um deles”.
No
lar havia um velho de quem Simão gostava especialmente. Era o sr. José um
militar reformado, que tinha lutado no ultramar e que tinha histórias
arrepiantes para contar.
Normalmente
ele não gostava de falar do que por lá se tinha passado, mas sempre que Simão
fazia algo de errado ou se queixava injustamente, ele tinha sempre uma história
para relembrar com um final que fazia o jovem repensar a sua atitude.
Fora
com ele que aprendera que a vida de rua não levava a nenhum lado, pois numa
situação de guerra, os menos formados era tidos como “carne para canhão” e
enviados para a frente de batalha. Para morrerem primeiro…
Verdade
ou não, fez Simão pensar duas vezes sobre o seu futuro.
Também
as conversas que tinha com a Rosária eram cada vez mais frequentes e mais
profundas.
Um
dia entrou no lar uma jovem que tinha tentado o suicido devido a uma amor não
correspondido. Como os pais eram pobres e não a podiam enviar para um lugar de
tratamento adequado, foram falar com o presidente da junta, que por um especial
favor, e a título excecional e de curta duração, sugeriu que ela ficasse lá
internada por uns tempos.
Calhou
a Simão ir limpar o vomitado dela, quando tentou mais uma vez o suicídio com
uma caixa de comprimidos que roubara da enfermaria.
Ele
ficou muito impressionado e Rosário reparando nisso chamou-o à parte, para o
jardim.
Sentaram-se
à sombra de uma árvore e Simão abalado só olhava para o chão e não dizia nada.
-
Ficaste muito impressionado. Não ficaste? – Rosária segurou a mão dele.
Ele
retirou a mão e não respondeu. Não queria parecer fraco.
-
Podes falar. Eu também me impressiono com certas coisas, apesar de já ter visto
muito.
Simão
abanou a cabeça e continuava sem falar.
-
Queres que me vá embora? – Perguntou levantando-se.
-
Não! – Disse ele de cabeça baixa e segurando-a com a mão.
Gostei
ResponderEliminar