Simão 3
Lentamente e a medo empurrou a porta e entrou.
- Bom dia! - A mesma voz cumprimentou-o num tom alegre.
- Bom dia! – Respondeu Simão da porta.
Ela levantou-se e foi ter com ele. Passou-lhe um braço ao redor dos ombros,
e levou-o gentilmente para a frente, para a sua secretária, ao mesmo que lhe dizia:
- Entra, não tenhas medo. Então, tu deves ser o Simão, certo?
Simão respondeu afirmativamente acenando a cabeça, enquanto, deitava
um olho ao redor.
Era uma sala grande, com uma parede de vidro que dava para um pátio
interior. Tinha na parede perpendicular do lado esquerdo três sofás e uma
mesa de apoio no centro com revistas em cima e na do lado direito uma pequena
estante de metal, cheia de dossiês. A encimá-la estava um vaso com uma planta e
uma máquina de café.
Ao meio da sala estava a secretaria ela, virada para a porta e de costas
para a parede de vidro.
Ela indicou-lhe a cadeira para que ele se sentasse e foi até à máquina do
café.
- Queres um?
- Não, obrigado. - Respondeu timidamente.
Ela tirou um para si, regressou para a secretária a volta, rodeando-a para
se sentar, e enquanto o ia bebericando da chávena, avaliava-o com o olhar e um sorriso
no rosto.
Simão estava a sentir-se incomodado e começou a mexer-se na cadeira.
- Ora bem. - Disse ela por fim. - Simão... Já ouvir falar muito de ti.
Ele engoliu em seco e corou. Ela reparando nisso riu-se.
- Não te atrapalhes, que aqui ninguém te julga. Estás aqui porque
precisamos de ti, vieste para ajudar e não para ser julgado. O que fizeste ou
não fizeste, fica para lá daquelas portas. Aqui és um Simão novo. Trabalhador,
responsável e educado pode ser?
Simão tinha bom coração e aquelas palavras acertaram-lhe em cheio. Não ser
julgado era o que mais queria. Com um sorriso e orelha a orelha, estendeu a mão
para um "passou bem", enquanto dizia:
- Temos negócio!!
Ela riu-se mais uma vez. Era uma mulher os seus 60 anos. Cabelo grisalho, comprido
que usava apanhado num coque. Tinha uns olhos castanhos, expressivos e risonhos
que se escondiam por baixo de uns óculos que passavam mais tempo no alto da
cabeça do que no nariz onde era o seu lugar. Embora não fosse gorda era um
pouco roliça, mas era alta pelo que o excesso de peso até não lhe ficava mal.
Ela levantou-se e ele imitou-a, ficando parado no mesmo sítio sem saber
mais uma vez como se comportar.
Ela foi até à porta e olhando para trás convidou-o a segui-la.
- Anda daí. Vou apresentar-te à equipa e mostrar-te os sítios. – Disse com
um sorriso convidativo.
Simão deu um pulo e alcançou-a. Foram pelos corredores fora até uma porta
que dizia sala dos enfermeiros. Ela bateu à porta e sem esperar pela resposta
abriu-a. Era novamente uma sala com uma parede de vidro que dava para um outro
claustro.
- Mas quantos pátios isto tem? - Pensou ele. Porém nada disse.
Esta sala era um pouco maior do que anterior. Tinha numa parede lateral um
móvel de cozinha apetrechado com armários, um lava loiça e vários eletrodomésticos
espalhados pela bancada, e canecas de chá empilhadas a secar.
Também espalhados pela sala estavam vários sofás e cadeirões e havia uma
mesa de refeições, sem cadeiras, junto a zona da cozinha.
Aquela hora estava vazia à exceção de um enfermeiro que fazia qualquer com
medicamentos e uma enfermeira que estava sentada com um computador no colo a
escrever algo. Estava de frente para o pátio e de costas para eles a apanhar o
sol que vinha pelos vidros.
- Bom dia! - Disse a Francisca, a diretora do lar
- Bom dia! - Responderam eles em coro.
- Bom dia. – Secundou
Simão baixinho. Tão baixinho que ninguém ouviu.
- Olá! – Disse o
enfermeiro voltando-se para eles. – O que traz aí debaixo do braço?
A enfermeira poisou o
computador e virou-se. Todos se riram menos o Simão. Não gostava que gozassem
com ele.
- Ora é o novo
ajudante. – Respondeu ela sorrindo e empurrando o Simão para ao pé da
enfermeira.
- Rosária, este é o
Simão. Vais ficar com ele para te ajudar no que necessitares. Ficas encarregue
dele pode ser?
Rosária sorriu e acenou
afirmativamente.
- Simão. – Francisca
voltou- se para ele. Esta é a Rosária. Como ouviste, vai ser a tua
coordenadora. Porta-te bem e verás que não terás problemas. E ainda vais ter
saudades nossas, quando os seis meses acabarem…– Piscou o olho aos enfermeiros
e despedindo-se, saiu da sala airosamente.
- Ora, ora. Temos um
novo ajudante. – O enfermeiro continuava a brincar. – Ó Rosária, reparaste se
ele tem língua? É que ainda não o ouvi falar...
Riu-se.
- Pára António.
Admoestou-o Rosária. – Não tens trabalho para fazer? Olha que eu tenho e não é
aturar-te!!!
Poisou o computador
aberto na mesa grande e pegou num tabuleiro com várias caixinhas com remédios
lá dentro. Colocou-o numa espécie de carrinho que tinha um aparelho de medir a
tensão portátil e um termómetro. Depois pegou numa prancheta com as fichas de
alguns utentes e entregou-a a Simão.
- Vamos! Está na hora
de irmos fazer a ronda. Eu dito e tu apontas pode ser?
E sem esperar pela
resposta saiu porta fora. Simão ficou parado com a prancheta na mão, aturdido,
sem saber o que fazer, mas um olhar mordaz de António foi o impulso que ele
precisava para se por a milhas dali.
Correu para a porta e
foi ter com Rosário que o esperava ao fundo do corredor.
- Não te atrapalhes. –
Disse-lhe sorrindo. – Ele é assim, mas é bom rapaz. E faz isto com todos. Não é
nada pessoal. Olha vamos agora dar a medicação ao sr. José. Eu vou entrar, tu
entras comigo e enquanto eu meço a temperatura e a tensão, tu vês a caixa que
tem o nome dele e pões os comprimidos no copo. Pode ser? Depois assentas os
valores que eu te disser na folha. Aqui é a tensão e aqui é a temperatura. –
Apontou para a folha com o nome do doente onde se viam 2 campos: tensão e
temperatura. – Em cima pões a data e a hora. E é igual para todos. Não é difícil,
pois não?
- Não. – Respondeu ele firme e
animado.
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