Lua 17
- Não! – Gritou ao vê-la a boiar na água.
- Não, não, não. – Repetia para si, enquanto tirava os sapatos e
atirava o casaco para cima da pilha da roupa dela.
- Não, por favor, não. Por favor! – Rezava a um Deus que sempre renegara,
mas que agora lhe parecia ser o único que o poderia ajudar. – Trá-la de volta,
por favor, por favor…
Esquecendo-se de que não sabia nadar bem, atirou-se mar dentro, que
sentindo-se incomodado com a presença de um estranho nas suas águas, ordenou às
ondas que se erguessem e o levassem para o fundo do mar, de modo a que não
alterasse o equilíbrio perfeito entre a Lua e a lua.
Valeu-lhe a Lua que entretanto se apercebeu do que se passava e de
imediato nadou até ele, puxando-o com forças que não sabia ter e lutando contra
o mar, e ajudada pela lua, o trouxe de volta à praia.
- Francisco, Francisco! – Agora era Lua quem chamava por ele,
aflita.
- Francisco! - Batia-lhe no peito e tentava reanimá-lo com a emoção
a sobrepor-se ao raciocínio. – O que foste fazer?! - Zangava-se com ele,
enquanto as lágrimas de arrependimento lhe mostravam o quanto fora injusta com
ele.
- Não me deixes! Volta! Anda! RESPIRA! - Ordenava-lhe, enquanto o virava
e iniciava agora as manobras de reanimação de uma forma firme e obsessiva.
- 30 compressões cardíacas, 2 sopros, 30 compressões, 2 sopros, 30,
2, 30, 2. - Comandava-se. – Não pares,
não pares!
- Coff, Coff! – Um ataque de tosse seguido de um vómito de água
salgada foi o que recebeu passado uns minutos que, se lhe perguntassem a
duração, responderia que tinham sido horas.
- Francisco! – Chamou-o como que para confirmar que ele tinha regressado.
- Coff, coff! – Foi a resposta que obteve.
Aliviada, abraçou-o, beijou-o, tornou a abraçá-lo, e a beijá-lo e
quando finalmente, sentada na areia, com ele nos braços, de olhos fechados, mas
consciente, ralhou-lhe para expulsar o seu arrependimento.
- Tu nunca, mas nunca, nunca… Nunca mais faças isto. Eu pensei que
tinhas morrido!!!
- Eu também. Foi por isso
que te fui salvar. – Disse em palavras entrecortadas
pela respiração aflita.
- Mas o que estás aqui a fazer? Como é que me descobriste? Porque é
que pensaste que eu tinha morrido? Porque é que vieste à minha procura? Quem te
disse onde estava?
Repetia-se nas perguntas, mas nenhum dos dois dava conta disso.
Queriam apenas sentir que o outro estava vivo, que estava bem, que
estava ali ao pé dele.
Francisco, depois de um bocado que necessitou para se
restabelecer, começou então a explicar,
primeiro como tinha chegado até ali, depois o porquê de ter saído do
restaurante, e finalmente começou por tentar dizer o quanto se afligiu quando
pensou que ela se tinha afogado. Não conseguiu chegar ao fim da frase, Lua,
sentindo o poder do corpo celeste, sentindo a sua luz, a sua energia,
cobriu-lhe a boca com um beijo, aflito, necessitado, exigente.
Os seus braços rodearam-no e ele recuperando todos os sentidos do
seu corpo, deitou-se sobre ela, explorando-a, cheirando-a, sentindo-a com as
mãos, com os lábios, com o corpo.
Primeiro com urgência, depois com a calma de quem se sabe dono da
certeza, de quem se sabe senhor do destino, amaram-se novamente fundindo os
corpos, entrelaçando as almas, juntando as vidas.
A entrega foi perfeita, abençoada pela lua, apadrinhada pelo mar, aplaudida
pelas ondas, e ele, compreendeu pela primeira vez na vida, o porquê da
intensidade desmedida dos sentimentos que sentia por ela.
Ela também o sentiu. Ela também o soube. Mas não o podia admitir.
Era casada. Tinha dois filhos. Tinha a responsabilidade de cobrar a maldição da
família. A sua mãe dissera-lho muitas vezes. Ela era a lua, ela iria mudar o
destino de todos. Não podia falhar.
- Não! – Gritou de repente.
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