Lua 13

 

- O que se passa? – Lua sentia o baixo ventre a ficar duro, e a dor forte a aparecer. Inconscientemente levou as mãos à barriga e fez um esgar de dor.

- O que se passa? Alguém me diz? – perguntava às pessoas que à sua volta formavam uma espécie de muro humano que não a deixava ver o que se passava.

Decidida a ver o que se passava, tentou abrir caminho por entre dois rapazes, mas sem querer, levou um encontrão que a fez dar um grito excruciante que pôs fim à confusão de gentes e feitios que ali se desenrolava.

- Lua! – Gritou Fernando largando o sogro.

- Lua! - Secundou-o Maria.

- Hospital, levem-me para o hospital! – gritava aflita.

O frenesim que se seguiu a isto foi intenso e culminou com Lua num barco a caminho da ilha grande com Fernando a seu lado.

O bebé nasceu, antes do tempo, mas nasceu perfeito.

Tinha uns olhos azuis acinzentados enormes, como os da mãe e cabelo escuro, muito escuro como o pai. Adivinhavam-se-lhe os caracóis. Lua encontrava-se bem e Fernando sentia-se o homem mais feliz do mundo.

Os dias da licença de paternidade, passou-os entre a maternidade e a casa, pois o bebé precisou de ficar na incubadora alguns dias para que ficasse em condições de ser apresentado convenientemente à vida.

- Odeio aquele homem! - Disse um dia aquando da sua visita à mulher e ao filho. Lua estava sentada no cadeirão do quarto segurando o Simão nos braços que dormia o sono dos justos.

- Bom dia. – Lua estendeu-lhe o rosto para um beijo. – Que homem? O que se passa?

- O almirante. Pedi-lhe uns dias de licença para vos ir levar ao continente, e recusou. Diz que já conheci o meu filho, já lhe toquei, agora tenho de trabalhar como os outros. Aí, se eu pudesse… - Fez um gesto agressivo, mas parou a meio, com medo de acordar o pequenito.

- Deixa-o, somos felizes à mesma. E vais ver que 3 anos passam depressa. – Lua temendo outro acesso de raiva como o de há uns meses, tentou aligeirar a situação.

E de facto passaram.

De regresso a casa, sozinha com o Simão, Lua dedicou-se de corpo e alma ao seu filho e ao curso, que agora mais do que nunca queria ver concluído.

Valeu-lhe a dona Vicência que assim que soube da notícia se prontificou para ser a avó de Simão.

No princípio tudo corria bem, Fernando chegava às sextas, de 3 em 3 semanas, a meio da tarde, e ia buscar o Simão a casa da Dona Vicência. Depois, os dois iam buscá-la ao hospital onde ela estagiava.

Então os três regressavam a casa e dedicavam-se ao filho que lhes enchia o peito, relegando para segundo ou mesmo terceiro plano, o amor que um dia os uniu.

Não que não continuassem a gostar um do outro, gostavam e muito, mas o que sentiam por Simão era tão grande e tão forte que roubava a memoria de um outro amor que de vez em quando espreitava, tentando aparecer, mas que de imediato era empurrado para trás por uma graça do Simão,  por uma dor do Simão,  por um cuidado que Simão precisasse.

Salvador nasceu numa oportunidade que esse amor encontrou, aproveitando uma sesta prolongada depois de uma vinda da praia, onde Simão, depois de construir um castelo e o defender com unhas e garras dos ataques das ondas e das gaivotas, descansou como um verdadeiro guerreiro.

Quando Salvador nasceu, já Simão tinha 3 anos e a sua mãe e o seu pai eram quase como estranhos Ele dedicado à sua carreira militar, cada vez mais longe de casa e do lar, e ela dedicada aos filhos e ao curso que, entretanto, acabara.

Foi no dia da sua licenciatura, ao vê-la ensimesmada, num contraste gritante com os colegas que riam e pulavam e festejavam o fim de uma etapa trabalhosa, que dona Vicência ousou falar com ela.

- Lua, filha. - disse-lhe com santiago a colo e Simão pela mão. – Porque estás tão calada? Não estás feliz?

Lua olhou para os filhos antes de responder.

- Estou, estou. - Forçou um sorriso. - Estou feliz e sozinha. - deixou escapar num murmúrio, mais para si do que para ela. Mas dona Vicência tinha o ouvido apurado pela experiência da vida e não deixou escapar.

- Sozinha? Então e os teus filhos? E o teu marido?

- O meu marido? - Lua devolveu-lhe a pergunta antes de ser puxada par uma colega para o desfile de finalistas.

- O teu pai? – perguntou Vicência a Simão que brincava entretido com uma fita que alguém lhe dera.

Vicência não foi a única a notar a tristeza no olhar de Lua, embora ela a escondesse atras de um sorriso luminoso, Afonso, que desde o primeiro dia a observava e a amava assistiu consternado à conversa.

 


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