Carolina 3

Carolina estava sentada no banco de madeira junto à praia, num local mais elevado, a observar o mar e as pessoas lá em baixo.
Quando não estava de nariz enfiado no livro a ler ou a escrever, gostava de se sentar e observar a paisagem e a vida à sua volta.
 Escolhia uma ou outra pessoa e imaginava uma vida para ela consoante o ar que ela apresentava, o modo como se vestia, o que fazia, se estava só ou acompanhada e pronto. Lá lhe surgia um conto assim do nada.
Fazia isto desde pequena quando a mãe a levava para a empresa e a deixava sentada horas a fio na sala de espera, juntamente com os clientes, enquanto “ia só assinar um papel”. “Não demoraria nada!”
Carolina sem mais do que poder fazer, a não ser observar, sim porque a mãe não lhe permitia maus comportamentos e nisso estava incluído falar com estranhos ou levantar-se e sair do lugar, punha-se então a imaginar porque é que aqueles senhores e senhoras ali estavam, e de onde vinham, e para onde iam depois de sair dali.
As vezes ainda se levantava, quando não estava ninguém na sala, e ia ter com a secretária da mãe e perguntava-lhe quem eram aqueles senhores e o que vinham ali fazer.
Assim cresceu a imaginar a vida dos outros e a "viver" a vida dos outros que no seu entender deveria ser melhor do que a sua.
Mas com isto não se pense que Carolina era uma pessoa triste e amargurada.
Como todos os sonhadores ela tinha a capacidade de olhar apenas para o lado bom da vida e encarar as situações problemáticas como um duelo que ela com as suas guerreiras imaginárias haveria com certeza de vencer.
Quando chegou à adolescência e conheceu a Rita e a Sandra, mostrou-lhes o mundo dos "Cinco", das "Gêmeas " das "Quatro torres" e a sua imaginação aliada ao espírito inquieto delas levou-as por caminhos soltos e colocou-as em sarilhos e aventuras que as tornaram fortes e destemidas e felizes, porque tinham se tinham sempre umas às outras para tudo.
Então um belo dia lembrou-se de criar um clube.
Falou com elas que se pronto aceitaram a ideia e começaram antes de tudo a escolher o nome.
Foi uma escolha difícil.
O facto de serem três adolescentes, teimosas e opinativas e com pouca tendência a ceder, dificultou a coisa. Por fim lá se decidiram. Clube do saiote, como " homenagem-picardia-humor" à Carolina que tivera a ideia.
Depois foi um sem fim de aventuras tentando imitar à letra as aventuras que nas tardes de sábado liam na garagem da Rita, tornada na sede do clube.
Claro que esta coisa da escrita não veio logo.
Carolina imaginava e vivia e chegava a casa cheia de vontade de contar as aventuras e desventuras do dia, mas a mãe nunca tinha paciência para a ouvir. Remetia-a sempre para a empregada que com tanto que tinha de fazer também pouca paciência tinha para a ouvir.
Um dia, já farta de a mãe não a ouvir, queixou-se à empregada que ninguém a ouvia e que qualquer dia destes haveriam de querer saber e ela não diria. Não diria porque não queria e porque não se lembraria! – sentenciou do alto dos seus 12 anos. Foi então que a empregada lhe deu a ideia da sua vida.
- Ó menina. Escreva. Assente tudo num caderninho e vai ver que não se esquece.
E virou as costas, continuando a aspirar a sala, deixando Carolina furiosa. Irritada subiu as escadas, foi para o seu quarto e sentou-se no chão.
Pegou numa bola que lá tinha e atirou-a contra a parede.
A bola fez ricochete e caiu em cima da secretária espalhando o que lá estava pelo chão. Aos pés da Carolina veio parar um lápis. Ela pegou nele. Furiosa para o atirar fora, mas a meio do caminho perguntou-se:
- E se?




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