Amigas Improvaveis 9


- Pensei que uma mulher do Norte, era forte e não precisava de ninguém. - Arreliou-a.
Uma almofada na cara e um” parvo" dito a sorrir foi a resposta dela.
Ele levantou-se, foi até a cozinha, desligou o forno e voltou com os dois copos de vinho nas mãos.
Sentou-se.
Ofereceu-lhe um e ficou a olhar para ela enquanto ela bebia um golo. – Como era pequenina…- Pensou com carinho.
           - Então, conta lá. O que se passou?
           - Foi a Maria. Ela alertou-me para o facto de que se eu ficar aqui não serei verdadeiramente independente. – A sua voz soou triste.
Ele abriu os olhos numa interrogação muda.
           - E o pior é que ela tem razão. – Suspirou.
           - E então o que pensas fazer?
João levantou-se mais uma vez e foi até à cozinha ver do jantar. Já estava pronto.
Ela levantou-se e foi atrás dele. Enquanto ele retirava as coisas do forno ela colocou a mesa. Sentaram-se.
           - Huumm. Isto está delicioso. – Comentou depois de engolir uma garfada. – Não sabia que gostava de … Que peixe é este?
           - Cação. – Respondeu ele divertido.
           - E estas batatas? São diferentes!
           - É batata doce. É saborosa e mais saudável.
João percebeu que ela não queria falar mais sobre o assunto. Estranhou, mas não disse nada. Talvez ela estivesse a crescer pensou com uma pontinha de tristeza. Gostava dela como ela era, genuína e impulsiva.
           O jantar correu devagar, ao ritmo de conversas banais e recordações do passado. O futuro, de momento, era tema tabu.
Levantaram-se após a última garfada da sobremesa e depois, enquanto arrumavam a loiça, Rita perguntou-lhe:
           - Enquanto eu não encontro uma casa para mim, importas-te que convide a Maria para vir aqui? Gostaria de fazer algo por ela e lembrei-me de a ensinar a trabalhar com o computador. Acho que ela iria gostar e far-lhe-ia bem…
           - Claro que sim. – João não demorou a responder, a sua natureza generosa era rápida a funcionar.
           - Claro que sim?! Importas-te? – Rita olhava-o de lado.
           Ele riu-se. Riu-se à gargalhada. Mais uma vez tinha conseguido confundi-la. Ainda não perdera o jeito. Rita quando percebeu, lançou-lhe novamente com a almofada, da cadeira da cozinha e desta vez acertou-lhe em cheio.
           - Ai! Estás a ficar pró! – Ele ria-se e fugia.
           - Pois estou. Com tanto treino…
           Rita sorriu e deu-lhe um beijo e um abraço efusivo. De repente virou-se e bocejando disse:
           - Vou-me deitar. Até amanhã.
           João riu-se e respondeu-lhe com um até amanhã em voz de menina dondoca que a fez rir, e enquanto que ela foi para o quarto dormir, ele ligou a aparelhagem, colocou os auscultadores e ao som da sua música favorita, fechou os olhos e pôs-se a pensar na vida.
Na sua vida. Em como ele tinha mudado desde que saíra daquele país, de ao pé daquelas pessoas. Do João que partira restava muito pouco, mas poucos sabiam disso. - E ainda bem! -   Pensou para si.              

​           Rita passou mal a noite. Tinha tido um sonho estranho, sem nexo, com pessoas que conhecia, mas que não sabia identificar e que a perseguiam, enquanto ela corria para o escritório que afinal era na quinta que se situava na América.
Acordou estremunhada e maldisposta. Levantou-se ainda meia zonza e dirigiu-se à casa de banho para o duche matinal.
- A vida parece mais cristalina depois de lavada - Dizia-lhe a mãe. – Com os olhos lavados vês melhor as coisas.
E assim era.
Enquanto se limpava lembrou-se que todos os procedimentos feitos nos computadores têm um rasto, pelo menos era isso que ela via nas séries policiais que devorava antes de se deitar.
Iria falar com o João, talvez ele tivesse algum amigo entendido nisso que a pudesse ajudar. E se ele não tivesse, iria procurar alguma firma na net. De certeza que haveria de encontrar alguma.
Já bem-disposta, vestiu um vestido com decote “à barco” azul debruado a branco, calçou umas sandálias rasas, em tons de azul condizentes com o vestido e olhando-se no espelho gostou do que viu. Estava apenas indecisa se apanhava o cabelo num rabo-de-cavalo ou o deixava solto.
Lembrou-se que o João lhe dizia que ela parecia uma miúda pequena quando usava o cabelo preso, pelo que o deixou solto. Queria parecer uma mulher.
Saiu do quarto, pronta para falar com ele quando ouviu a porta a abrir-se e a fechar-se.
Correu a chamá-lo, mas já não foi a tempo. O elevador já descia.
– Não faz mal! - Pensou. – Logo falo com ele, e, entretanto, vou pesquisando alguma coisa.
Quando chegou ao escritório estranhou não ver a Maria, mas não deu importância ao caso. Talvez tivesse de faltar para ir ao médico, pensou.
– Logo ligo-lhe. – Disse para si, mas só então percebeu que não tinha o telefone dela. Tinha-o apagado sem querer. Também não tinha a morada. Como é que era possível saber tão pouco acerca dela? – Ralhou-se.
Perguntou a algumas colegas, mas nenhuma sabia mais do que o nome e que era viúva e com dois filhos. Afinal ela era só a empregada de limpeza, porque, raio haveriam de saber mais do que isso?
Rita sentiu-se furiosa com aquelas pessoas, mas nada disse, porque olhando para si ela tinha-a tratado da mesma forma, ou quase. Tinha aceite a sua ajuda sem nada oferecer em troca, nem sequer a sua amizade, o seu cuidado.
Foi nesse momento que decidiu ensinar-lhe a usar um computador, custasse o que custasse.
Já tinha falado nisso ao João e já o tinha convencido a deixá-las usar a sua casa, agora só faltava convencer a Maria a lá ir.
 Iria também ajudá-la a arranjar outro emprego, um emprego melhor. Ela merecia mais do que isto, mas primeiro tinha de aprender a trabalhar com computadores, e isso estava decidido, nem que para tal tivesse que….
Foi interrompida pelas gargalhadas de Odete que muito alto dizia à Joana que a partir daquele dia já só faltava uma. A outra já tinha “ido com os porcos”.
Rita primeiro não percebeu. Levantou os olhos do ecrã e ficou a olhar para as duas. Viu em Odete um sorriso de vitória e na outra um ar comprometido. De repente, “fez-se luz” na sua cabeça.
Levantou-se, vermelha de fúria, e esquecendo toda a prudência, avançou para Odete perguntando--lhe num tom de voz duro:
- Quem é que foi com os porcos?
Odete voltou-se altiva, e com um sorriso sarcástico respondeu-lhe ironicamente:
- Ai a menina não sabe? A sua amiguinha, a sua mãezinha, foi despedida hoje.
- Como? – Rita não queria acreditar.
- Como? Com uma ordem de despedimento. Apanhei-a a mexer no meu computador.
Zás!
O som de um estalo ecoou na sala que tinha ficado estática para assistir à conversa entre elas.


(Continua)


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